Reprodução/Cimi
Índios no Povoado de Bahias, em Viana, no Maranhão
CAROLINA LINHARES
DE BELO HORIZONTE
Folha.com
Um ataque deixou ao menos 13 indígenas do povo Gamela feridos, sendo três em estado grave, no Povoado de Bahias, em Viana, no Maranhão. Um deles teve as mãos decepadas e os joelhos cortados, segundo Inaldo Cerejo, uma das vítimas. O governo do Maranhão não confirma.
O indígena diz que a ação ocorreu no domingo (30), por volta das 17h, quando os índios deixavam uma área retomada por eles no último dia 28. “Avaliamos que não era seguro e começamos a recuar. Ficou apenas um grupo menor, que sofreu o ataque”, disse.
O território reivindicado pelo povo Gamela não foi demarcado pela Funai (Fundação Nacional do Índio).
Cerejo foi baleado na cabeça e fraturou os dedos da mão. Ele e outros quatro indígenas baleados foram levados para o hospital Socorrão 2, em São Luís. Cerejo e Francisco da Luz já receberam alta.
Outros três permanecem internados, ainda segundo Cerejo. Um deles é Aldeli Ribeiro, que teve as mãos amputadas e os joelhos cortados, além de ter sido atingido por um tiro na costela e um na coluna. Seu irmão, José Ribeiro, levou um tiro no peito e também permanece hospitalizado. O terceiro baleado é José Ribamar.
Os demais feridos tiveram cortes de facão pelo corpo e foram atendidos em Viana e cidades próximas.
“O grupo estava armado com espingardas e revólveres. Parece que estava tudo já programado para o ataque. A polícia estava lá parece que só esperando uma tragédia. Hoje de manhã o boato na região é de que eles voltariam para invadir uma aldeia que foi construída depois da retomada”, disse Cerejo.
ATAQUE ORGANIZADO
Segundo Cerejo, após a retomada do território no dia 28, fazendeiros e pistoleiros da região organizaram uma reunião para expulsar os índios.
A Comissão Pastoral da Terra do Maranhão (CPT-MA) também condenou a suposta articulação: “Denunciamos, neste contexto, que a ação criminosa e violenta ocorrida neste domingo foi planejada e articulada por fazendeiros e pistoleiros da região, que, através de um texto no Whatsapp, convocavam pessoas para o ataque contra os indígenas”.
Houve ainda uma entrevista concedida pelo deputado federal Aluísio Mendes (PTN-MA) a uma rádio local em que ele comenta a retomada dos índios e se refere ao grupo como “pseudoindígenas”. Ele diz ter falado com o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, a Funai e a Polícia Federal para “dar tranquilidade e alento a essa população tão ordeira e trabalhadora que está sendo ameaçada [pelos índios] nesse momento”.
“Foi um incitamento à violência que ocorreu no dia seguinte”, diz Cerejo, para quem a polícia foi omissa, concluindo o resgate dos indígenas por volta das 22h.
“Hoje de fato passou uma viatura na rodovia estadual que corta nosso território. Pra gente é muito pouco. Apesar de o governo do Estado dizer que está agindo, pra gente é uma inação. Uma viatura que passa não está fazendo a segurança de um grupo que está sendo ameaçado”, diz.
INVESTIGAÇÃO
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), afirmou pelo Twitter que equipes das polícias civil e militar “já foram mobilizadas para localizar e prender todos que violaram a lei e praticaram violência”.
“O governo do Maranhão também apura se políticos instigaram ou não atos de violência, pois isso também é inadmissível. Repudio qualquer violência, sejam ou não indígenas. Tudo será apurado pela polícia e entregue ao Ministério Público e ao Poder Judiciário”, afirmou.
Em nota, o Ministério da Justiça informou que “está averiguando o ocorrido envolvendo pequenos agricultores e supostos indígenas”. Minutos depois, o texto publicado no site do ministério foi editado e a palavra “supostos”, retirada. Numa terceira mudança, saiu a palavra “indígenas”.
Segundo a assessoria, o ministro Osmar Serraglio determinou o envio de uma equipe da Polícia Federal para o local “para evitar mais conflitos” e “ofereceu apoio” à Secretaria de Segurança Pública do Maranhão. Procurada pela reportagem, a pasta estadual não respondeu até a publicação deste texto.
A Funai afirmou que sua coordenação regional em Imperatriz “está mobilizada tomando todas as providências necessárias no caso. A procuradoria da Funai está em contato direto com o delegado do município de Viana, e nossos servidores acompanharão em loco o inquérito a partir de amanhã”.
“Também será formado amanhã pela manhã um comitê de crise com os diretores e o presidente da Funai para prestar toda a ajuda necessária aos feridos e garantir o cumprimento da lei”, disse o órgão, em nota.
CONFLITOS
Segundo a Comissão Pastoral da Terra do Maranhão (CPT-MA), há cerca de 360 conflitos por território no Estado. Em 2016, foram registrados 196 episódios de violência, levando a 13 assassinatos e outras 72 ameaças de morte.
O povo Gamela já havia sofrido outros dois ataques, em 2015 e 2016.
Somente no mês passado, conflitos por terras deixaram dez mortos —nove trabalhadores rurais em Colniza (MT) e um dirigente do MST (Movimento dos Trabalhadores Ruarais Sem Terra) em Minas. Outros três integrantes do MST foram baleados em Capitão Enéas, no norte de Minas.
Em março, uma liderança do MST, Waldomiro Costa Pereira, foi morta a tiros em um hospital no Pará, onde estava internado após ter sido baleado.
CAROLINA LINHARES
DE BELO HORIZONTE
Folha.com
Um ataque deixou ao menos 13 indígenas do povo Gamela feridos, sendo três em estado grave, no Povoado de Bahias, em Viana, no Maranhão. Um deles teve as mãos decepadas e os joelhos cortados, segundo Inaldo Cerejo, uma das vítimas. O governo do Maranhão não confirma.
O indígena diz que a ação ocorreu no domingo (30), por volta das 17h, quando os índios deixavam uma área retomada por eles no último dia 28. “Avaliamos que não era seguro e começamos a recuar. Ficou apenas um grupo menor, que sofreu o ataque”, disse.
O território reivindicado pelo povo Gamela não foi demarcado pela Funai (Fundação Nacional do Índio).
Cerejo foi baleado na cabeça e fraturou os dedos da mão. Ele e outros quatro indígenas baleados foram levados para o hospital Socorrão 2, em São Luís. Cerejo e Francisco da Luz já receberam alta.
Outros três permanecem internados, ainda segundo Cerejo. Um deles é Aldeli Ribeiro, que teve as mãos amputadas e os joelhos cortados, além de ter sido atingido por um tiro na costela e um na coluna. Seu irmão, José Ribeiro, levou um tiro no peito e também permanece hospitalizado. O terceiro baleado é José Ribamar.
Os demais feridos tiveram cortes de facão pelo corpo e foram atendidos em Viana e cidades próximas.
“O grupo estava armado com espingardas e revólveres. Parece que estava tudo já programado para o ataque. A polícia estava lá parece que só esperando uma tragédia. Hoje de manhã o boato na região é de que eles voltariam para invadir uma aldeia que foi construída depois da retomada”, disse Cerejo.
ATAQUE ORGANIZADO
Segundo Cerejo, após a retomada do território no dia 28, fazendeiros e pistoleiros da região organizaram uma reunião para expulsar os índios.
A Comissão Pastoral da Terra do Maranhão (CPT-MA) também condenou a suposta articulação: “Denunciamos, neste contexto, que a ação criminosa e violenta ocorrida neste domingo foi planejada e articulada por fazendeiros e pistoleiros da região, que, através de um texto no Whatsapp, convocavam pessoas para o ataque contra os indígenas”.
Houve ainda uma entrevista concedida pelo deputado federal Aluísio Mendes (PTN-MA) a uma rádio local em que ele comenta a retomada dos índios e se refere ao grupo como “pseudoindígenas”. Ele diz ter falado com o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, a Funai e a Polícia Federal para “dar tranquilidade e alento a essa população tão ordeira e trabalhadora que está sendo ameaçada [pelos índios] nesse momento”.
“Foi um incitamento à violência que ocorreu no dia seguinte”, diz Cerejo, para quem a polícia foi omissa, concluindo o resgate dos indígenas por volta das 22h.
“Hoje de fato passou uma viatura na rodovia estadual que corta nosso território. Pra gente é muito pouco. Apesar de o governo do Estado dizer que está agindo, pra gente é uma inação. Uma viatura que passa não está fazendo a segurança de um grupo que está sendo ameaçado”, diz.
INVESTIGAÇÃO
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), afirmou pelo Twitter que equipes das polícias civil e militar “já foram mobilizadas para localizar e prender todos que violaram a lei e praticaram violência”.
“O governo do Maranhão também apura se políticos instigaram ou não atos de violência, pois isso também é inadmissível. Repudio qualquer violência, sejam ou não indígenas. Tudo será apurado pela polícia e entregue ao Ministério Público e ao Poder Judiciário”, afirmou.
Em nota, o Ministério da Justiça informou que “está averiguando o ocorrido envolvendo pequenos agricultores e supostos indígenas”. Minutos depois, o texto publicado no site do ministério foi editado e a palavra “supostos”, retirada. Numa terceira mudança, saiu a palavra “indígenas”.
Segundo a assessoria, o ministro Osmar Serraglio determinou o envio de uma equipe da Polícia Federal para o local “para evitar mais conflitos” e “ofereceu apoio” à Secretaria de Segurança Pública do Maranhão. Procurada pela reportagem, a pasta estadual não respondeu até a publicação deste texto.
A Funai afirmou que sua coordenação regional em Imperatriz “está mobilizada tomando todas as providências necessárias no caso. A procuradoria da Funai está em contato direto com o delegado do município de Viana, e nossos servidores acompanharão em loco o inquérito a partir de amanhã”.
“Também será formado amanhã pela manhã um comitê de crise com os diretores e o presidente da Funai para prestar toda a ajuda necessária aos feridos e garantir o cumprimento da lei”, disse o órgão, em nota.
CONFLITOS
Segundo a Comissão Pastoral da Terra do Maranhão (CPT-MA), há cerca de 360 conflitos por território no Estado. Em 2016, foram registrados 196 episódios de violência, levando a 13 assassinatos e outras 72 ameaças de morte.
O povo Gamela já havia sofrido outros dois ataques, em 2015 e 2016.
Somente no mês passado, conflitos por terras deixaram dez mortos —nove trabalhadores rurais em Colniza (MT) e um dirigente do MST (Movimento dos Trabalhadores Ruarais Sem Terra) em Minas. Outros três integrantes do MST foram baleados em Capitão Enéas, no norte de Minas.
Em março, uma liderança do MST, Waldomiro Costa Pereira, foi morta a tiros em um hospital no Pará, onde estava internado após ter sido baleado.