Pedro Cardoso da Costa |
Nossa sociedade constrói a premissa de que os nossos congressistas, senadores, deputados federais e estaduais e vereadores precisam legislar sempre, sem discutir se há ou não necessidade. Daí que alguns institutos avaliam a participação do deputado pela quantidade de projetos apresentados e aprovados. Talvez seja hora de repensar esse modelo de Legislativo.
Faz parte da natureza humana querer ser o melhor, o mais destacado, o mais criativo, quiçá até o mais inteligente. Mas no trabalho, mesmo como representantes do povo, deve ser levado em consideração a qualidade, a relevância e o resultado objetivo de qualquer projeto apresentado.
Há alguns anos, escrevi que as casas legislativas brasileiras não deveriam ser comparadas às indústrias, nem analisadas pela criação anual de normas, porque acima de tudo, o importante seria o benefício geral trazido por elas.
Quando um projeto de lei é apresentado, ele passa pela análise, recomendação e votação de vários órgãos internos, especialmente pelas várias comissões permanentes da Câmara dos Deputados e do Senado, apenas para restringir à esfera federal.
No site da Presidência da República consta um link que relaciona todas as normas federais, dentre as quais estão as leis ordinárias, um número muito acima das demais normas legais.
Consta, por exemplo, que foram aprovadas 172 leis só em 2013, o menor número dos últimos 4 anos. Na década passada, foram sancionadas 2.235 leis ordinárias.
A questão central é que mais de 90% dessas leis são para destinar dotações orçamentárias aos órgãos federais, atribuir nome de trechos ou de estradas federais, nome de viadutos, datas comemorativas e até para homenagear determinadas categorias, com um dia destinado a elas, com direito a feriado para a respectiva categoria. Mais um dia de descanso dentre os muitos feriados.
São exemplos, a Lei 12.884, de 21.11.2013, institui o Dia Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade; a Lei 12.907, de 18.12.2013, abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, crédito especial no valor de R$ 2.350.000,00, para os fins que especifica; a Lei 12.885, denomina “Rodovia Adão Gasparovic” o trecho da rodovia BR-163 compreendido entre o entroncamento com a BR-277 e o entroncamento com a BR-467, no Contorno Oeste da cidade de Cascavel, no Estado do Paraná; a Lei 12.882, de 12.11.2013, dispõe sobre a denominação do novo Prédio da Administração da Faculdade de Direito, no Campus da Universidade Federal do Amazonas, na cidade de Manaus.
Por terem a mesma natureza, presume-se que todas passem pelo mesmo trâmite burocrático, ainda que seja por mera formalidade, com todos os pareceres já padronizados. Mesmo assim, não deixa de ser desperdício de tempo e de mão de obra, que deveriam ser canalizados para matérias mais relevantes e de abrangência maior.
Pelo método que avalia o parlamentar pela quantidade de leis aprovadas, um deputado que tivesse 50 projetos aprovados desses acima seria incomparavelmente melhor do que outro que aprovou as aposentadorias para idosos da zona rural, de quem criou o seguro-desemprego ou de quem instituiu o divórcio.
Não se duvida de que todas as normas têm sua relevância, sua importância, mas os procedimentos de liberação de verbas federais, de nome de órgãos, de implantação de dia de categoria poderiam ficar adstritos às atribuições poderiam ficar adstritos às atribuições de determinadas comissões internas do governo federal, mesmo que criadas especificamente para essa tarefa.
Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito
"NÃO HÁ DEMOCRACIA ONDE O VOTO É OBRIGATÓRIO"